O tempo
estava virando numa rapidez incontrolável. Vinha tempestade por aí, uma até
pior do que a estava acontecendo dentro de si. A vida parecia tão boa, novos
amigos, um novo emprego que adorava. Deus e ele de mãos dadas, e ela de repente
surge. Ele queria de verdade esquecer tudo, mas emergiu em sua memória cada
agri-doce lembrança. De todas as vezes que brincaram juntos, dela lhe dizendo
que quando ele crescesse ia namorar com ele, e ele acreditando. Lembrara do som
da gargalhada dela quando ele espirrava-lhe água no quintal dos fundos do
jardim da igreja e de seus gritinhos histéricos. E daquele fim de semana em que
ele acreditara que poderia voar. Quando finalmente a beijou e foi
correspondido, em que adormeceram um nos braços do outro na rede da varanda de
seu tio vendo o sol se pôr. Naquele fim de semana em que ela perdera o medo de
ser dele, em que ousou caminhar junto de mãos dadas, cavalgar, experimentar
frutos arrancados do pé. Vestida de macacão sujo de morangos roubados da
fazenda vizinha, os dois desgrenhados tomando banho na caixoeira pra tirar a
lama dos cabelos dourados de ambos. Tudo era perfeito, tudo era lindo e tudo
era muito pouco pra ela ficar, pra ela querer, pra ela levar a sério o que
dizia seu coração.
Ele
também lembrou que viu verdade em seus olhos azuis quando sem piscar disse que
o amava:
-
Caio isso parece tão louco e improvável, meu menino, meu…ahhh não dá pra negar
que eu te amo! Eu nunca me senti assim, nunca me amaram assim. - ela falou com
a voz grave embargada pelas lágrimas que ameaçavam vir no rosto forte e
impedernido daquela menina que nunca chorava, desviou os olhos e tentou
conter-se.
Ele a
trouxe pra si e falou:
- Te amo
Luiza, e eu sei que sou um moleque, mas aposta em mim. Eu vou ser tudo o que
você precisar. Eu já sou teu!
Ela o
beijou ternamente ao invés de responder e o abraçou mais forte ainda como se
nunca mais fosse voltar a vê-lo. Ele achou que era um sim, ela sabia que era um
adeus.
Na manhã
seguinte ele procurara ela por toda a fazenda e só encontrara um bilhete.
"Eu
tive que partir. Não importa nada do que eu sinta Caio, minha vida não é aqui.
Nem mesmo com você. Luisa."
Ele
havia sofrido o pão que o diabo amassou com o rabo, ficou revoltado, virou
mulherengo, deixou sua família extremamente preocupada com o menino sensato que
de repente se transformara em um cara que não valorizava os sentimentos de
ninguém. Não levava nada a sério, nunca. Foi quando caiu em si aos dezessete
anos e Deus o chamou a responsabilidade de ser um homem melhor e não uma vítima
gerando outras, que ele devia superar o sofrimento com honra e não desonra, que
deveria retribuir o desamor com amor. Que amar ao próximo ainda era mandamento
e que ele precisava disso pra ser feliz. Que há em cada ser humano um potencial
incrível pra amar e compartilhar amor é viver. Ele aprendeu, ele creu e se
redimiu, entregou suas dores por Luisa pra Deus e passou a viver de um modo
mais justo e digno, pediu perdão a quem magoou e nem sempre foi correspondido
com um "eu aceito", mas tentou. E viu que a vida ali estava pequena
ele precisava abrir as asas e conhecer novas pessoas. Decidiu reescrever a
história. E bem agora no melhor do capítulo ela ressurge. Porque a lembrança
ainda dói?
-
Arrrrghhhh!!!! Que droga! Preciso sair daqui! - berrou Caio pro apartamento
vazio, pegou o elevador e desceu, foi até o prédio onde Rodrigo morava e pensou
em chamar ele pra um bate papo, mas não queria que ele lhe fizesse perguntas
sobre ela. Ele estava com a cabeça cheia sobre Mel, certamente. Então foi andar
pelas ruas do bairro, cobriu-se com o capuz e seguiu a passos firmes em direção
nenhuma pra qualquer lugar, como se pudesse fugir dos pensamentos que o
pressionavam. Começou a orar, queria paz, mas se lembrava dela e não conseguia,
parecia que cada lembrança aumentava potencialmente aquilo que há tanto tempo
realmente não o perturbava mais. Queria pensar em outra coisa, qualquer coisa e
foi aí que surgiu uma outra lembrança uma recente dessa vez, de um sorriso doce
e tímido, e ele sentiu paz e calma. "Não, Caio. Não dá pra incluir mais
gente na tua confusão se resolve primeiro." E voltou pra casa, deu de cara
com sua prima sentada no sofá com um homem e um bebê, com o canto do olho viu
as malas perto do sofá.
-
Priscila?
- É
Rebeca, eu detesto essa cafonice de dois nomes.
- Ok!
Rebeca, o que houve? Tudo bem? Você se casou?
- Sim,
eu não queria que a familia toda soubesse, sabe como eles são e… deixa eu te
apresentar meu marido, Caio. Este é Robson e essa é a nossa pequena filha
Amanda.
- Ela é
linda. Parabéns, gente! - falou ela genuinamente feliz depois de um dia tenso.
- E então, quanto tempo vão ficar? Vocês podem ficar no quarto eu fico aqui na
sala. Vem, vou instalar vocês. Estão com fome? Posso preparar alguma coisa. Vai
ser bom ter mais gente em casa por uns dias.
- Errrr
Caio. É que não temos onde morar por enquanto e vou precisar recuperar meu
apartamento. Robson… ficou sem o emprego quando viajamos e agora preciso ter um
espaço pra gente. Sabe, eu sei que foi horrível isso da minha parte, mas o
lugar aqui é muito pequeno, apartamento de solteiro.
- Ok,
Priscila eu entendi. Quero dizer Rebeca. De qualquer forma acomodo vocês no
quarto e saio pela manhã, tudo bem pra você.
- Claro,
nem precisava sair correndo.
- Eu vou
ficar bem. Eu vou ficar ótimo. Muito mais fácil um se virar do que três. E essa
pequena tem que ter o cantinho dela.
A
tempestade anunciada realmente caiu ainda não com água, mas estava difícil ver
uma luz no fim do túnel. Primeiro Luisa, depois Priscila ou melhor Rebeca que
faz o favor de o colocar pra fora. Não tinha a menor idéia de pra onde ir.
Arrumou sua mochila pra partir assim que amanhecesse, colocou alguns biscoitos
e frutas nela porque fizera compras recentemente e ficar na rua com fome não
estava em seus planos. Sim, era orgulhoso o suficiente pra não ficar de entojo
no apartamento da prima quando ela estava iniciando uma família e deixando
claro pra ele que não o incluía. Ele tentou dormir no sofá, mas o sono não
vinha. Pra onde ele iria? Ele viu o sol raiar da janela, com uma xícara de café
nas mãos, deixara a cozinha limpa e o café pronto um bilhete sobre a mesa e
saiu sem pronunciar som. Eles estavam cansados da viagem, ele estava exausto
daquela noite mau dormida com intervalos de pesadelos e sonhos com Luisa. Decidiu
que procuraria seu Rafael e pediria um adiantamento pra ele se arranjar em uma
pensão, mas como faria isso com uma semana de emprego? Ajeitou a correia da
mochila e desceu, ficou na portaria ainda tentando decidir o que faria. Quando
Rodrigo apareceu e sem pensar duas vezes lhe ofereceu um teto ele teve certeza
de que realmente as coisas podiam não ser tão ruins. Dividir apartamento com
seu novo amigo e pagar com serviços culinários, era no mínimo resposta as suas orações. Deus
ainda o amparava e se mantinha rente ao seu coração.
Rodrigo
o deixara sozinho pra se instalar no apartamento. Ele foi colocando suas coisas
num canto e procurando uma forma de ajudar. Passou a tarde se organizando,
ligou pra mãe e avisou que não enviasse nenhuma carta para o atual endereço que
havia se mudado, para outro anexo. Conversou bastante com D. Lurdes e foi para
o trabalho. Sem notícias de Rodrigo e logo percebeu o motivo ele havia
esquecido o celular em
casa. Colocou no bolso o celular dele afim de passar no
escritório e entregar. Ficou ainda mais preocupado porque ele não fora
trabalhar.
"Onde
você está cara!"
- Ele
avisou que iria chegar mais tarde. Não se preocupe.
- Ok,
obrigado pela informação viu.
Saiu de
lá e voltou ao ateliêr terminar um serviço para seu Rafael, quando seu celular
vibrou e ele viu uma mensagem de Carol que dizia : "Minha babá está
chorando". "Meu Deus o que será que houve com ela". Fechou a loja e voltou pra casa agora eram
duas preocupações Dora e Rodrigo. Quis subir para ver como ela estava, pois
esse horário devia estar esperando os pais de Carol. Ficou parado na portaria
quando de repente viu vindo em sua direção sorrindo daquele modo que tantas
vezes lhe derretera o coração, Luisa, seu sonho e seu pesadelo. O pior era
saber, com certeza, que embora lhe tenha causado dor, ele não a odiava. Será
que ainda a amava?
- Oi?
- Oi. O
que faz aqui Luisa?
-
Precisava te ver. Seu amigo não lhe entregou meu cartão?
- Não.
Eu não quero ser rude com você depois de tanto tempo. Só que meu amigo deu um
sumiço e estou preocupado. Tudo bem se conversarmos outro dia?
- Você
sabe que eu tinha que ir, na mesma proporção que queria ficar. Te ver me deu
certeza de que… - ela ergueu a mão e tocou seu rosto a barba estava por fazer,
havia cansaço nos olhos verde-mar. - Caio… me perdoa. - ela se aproximou na
intenção de beijá-lo ele manteve-se firme em sua posição de não permitir que
ela o alcançasse e estava sendo difícil resistir a atração. Até que um toque de
celular familiar o despertou daquele visgo e ele avistou Dora há uns dez
passos.
- Dora?!
- ele viu a cor abandonar o rosto da menina enquanto atendia a rápida ligação
que culminou com ela desabando no chão,
ele a alcançou em três passos desesperado e a pegou nos braços.
- Dora o
que houve? Pelo amor de Deus, fala comigo.
Ela
tremia convulsivamente e chorava muito. Ele a abraçara forte a mantendo perto
de si.
-
Levanta Dora, vem comigo.
- O que
houve com ela? - perguntou Luisa preocupada com a menina.
- Minha…
mãe. Ai! Ai meu Deus não!
- Calma,
fala com a gente, Dora, não é? O que tem a sua mãe? - falou Luisa com voz
maternal.
- Luisa
por favor, pode chamar um táxi tenho que levá-la pra casa ou hospital.
- Tudo
bem. Tome o celular dela.
- Dora,
fala comigo, minha linda pra quem eu ligo? O que houve com a sua mãe.
Eram
olhos ternos, e ele a abraçava com eles também, sentiu mais vontade de chorar
do que responder e se agarrou a ele e entre soluços disse as palavras que
admitindo lhe cortara o coração:
- Ela
acaba de falecer.
Ele a
apertou mais junto ao peito e beijou ternamente seus cabelos no topo da cabeça.
Ele não tinha palavras pra confortá-la seu ombro amigo agora era o que podia
oferecer. Ele jamais imaginara que dor absurda sentiria se perdesse sua mãe e
isso o fez chorar por ela. Luisa conseguira o táxi, ele foi com Dora e quando
Luisa tencionou ir junto ele a parou:
- Muito
obrigado por tudo. Eu assumo daqui, mais tarde nos falamos.
- Ok,
espero que melhore Dora. Até mais Caio.
foi tudo
muito turvo e complicado até ali. Ele não conseguiria falar com Rodrigo onde
estava, pois estava com seu celular, mandou mensagem pro celular de Mel e pediu
que avisasse na portaria pra onde ele havia ido e que avisassem Rodrigo.
Chegando
ao hospital conhecera Lia, que aparentava calma, mas estava desestabilizada e
tentava acalmar Dora. Ele assumiu ali junto com os médicos como se daria a
liberação do corpo e os tramites com a assistência funerária, vez por outra
lhes pediam os documentos necessários e assinaturas. Precisaram dar remédios a
Dora que estava evoluindo um estado bem grave de choque emocional. Ele ligou
para os pais de Carol e os notificara que ela não trabalharia essa semana. Ele
as amparou em todo o momento, a noite caiu por completo e Rodrigo e Mel
apareceram, Mel se apressou em ficar ao lado da amiga e Rodrigo foi pra perto
de Caio saber dos detalhes.
- Como
foi isso?
- O
coração dela estava fraco, era diabética e o quadro evoluiu pra um AVC muito
grave e sem muitas chances de recuperação. Cara, que dia! Vê-la nesse estado tá
acabando comigo. Sendo dopada de duas em duas horas.
-
Imagino, você comeu alguma coisa Caio? Você tá com uma cara de que vai cair a
qualquer momento. Ela vai precisar ainda muito de você, bem e forte. Vamos a
lanchonete aqui em frente trazer comida pra elas, também devem estar famintas.
- Eu não
to com fome, cara, preciso ficar perto dela.
- Eu
estou falando sério Caio. Você vem comigo ela está bem com a Mel e sua irmã no
momento.
-
Espera. - ele foi até onde ela estava sentada e se abaixou pra ficar na altura
de seus olhos.
- Dora,
olha pra mim, anjo. Como você está?
- Como
você acha?
-
Devastada. - falou desolado olhando para aqueles lindos olhos castanhos e
tristonhos.
- Parece
que você também e ela nem era seu parente.
Ele
pegou as duas mãos dela e a olhou fundo nos olhos.
- É por
que está doendo em mim também te ver assim. Eu sei que palavras não mudam a
dor, e honestamente você vai senti-la por um bom tempo e depois isso vai se
transformando em algo que não vai produzir tantas lágrimas, mas uma saudade
gostosa, das lembranças que vocês construíram juntas e vai ser grata por tê-la
tido pelo tempo que teve, por ter aprendido a ser quem é por ela ter lhe
ensinado. E vai ver nos seus atos os princípios que lhe passou e em seu olhar
refletir a imagem da mulher que ela projetou em você. Essa mulher
incrível que eu já vejo que você é.
Ela se
jogou nos braços dele e ele a envolveu num longo abraço beijando seus cabelos.
- Vai
ficar tudo bem, pequena. Eu estou aqui. Vou sempre estar aqui pra você.
Mel e
Lia também choravam ao ouvir suas palavras. Caio surpreendera por ser tão
maduro pra idade, por cuidar dela daquele jeito, era de se invejar um homem que
era tão sólido assim para uma mulher.
- Eu vou
buscar algo pra vocês comerem tudo bem?
- Você sempre
me alimentando. - riu-se tristemente
- Quero
vocês bem alimentadas, ok? - ele a devolveu para os braços de Mel e Lia e se
foi com Rodrigo.
…….
Fora uma
noite longa, Caio descobrira ali que Dora ficara sozinha no mundo, a casa onde
morava com a mãe e a irmã era alugada, o salário dela não dava pra pagar
sozinha e a irmã saíra do funeral direto pra casa do pai. Lia dera a Caio o
endereço em que estava e também os números de contato com o pai de Dora, pois
já sabia que ela não o procuraria.
- Sei o
quanto se importa com minha irmã, Caio e lhe agradeço. Ela é cabeça dura e não
vai pedir ajuda ao pai, mas precisa dele. Eu virei vê-la mais vezes embora
esteja morando longe daqui, não quero abandoná-la.
Dora só
tomara uma única decisão não ligaria para seu pai. Mel a abrigou na sua casa
por uns tempos até Dora decidir se ligaria ou não. Ela ofereceu que morarem
juntas, mas Dora não estava em condições de decidir nada, só dormia, comia,
obrigada por Caio e Rodrigo, e chorava durante dois dias inteiros. Eles se revezavam
em cuidar dela, Rodrigo era só mimos, Mel lhe escovava os cabelos e ajudava a
se reerguer. Carol fora visitá-la no apartamento de Mel e levou flores e um
desenho. Porém, na manhã seguinte ao acordar Mel descobrira que Dora havia
sumido, sem um bilhete, sem nenhum rastro. Ligou imediatamente pra Caio que
chegou num pulo no apartamento de Mel.
- Caio!
Ela sumiu!
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